segunda-feira, 2 de março de 2020

Duas Sugestões de Políticas: Futebol e Maconha Ante o Distributismo


Como pensa um economista da linha distributivista? Como se avaliar políticas públicas ou medidas do mercado sob o ângulo distributivista?

Nas faculdades de economia, aprende-se a avaliar uma política econômica sob o ângulo liberal, keynesiano ou comunista. Economistas sabem dizer o que pensa um economista liberal ou comunista ou keynesiano. 

Por exemplo, recentemente, o ministro da economia Paulo Guedes, formado na escola de economia mais liberal do mundo (Universidade de Chicago) e exaltado por seus amigos no mercado e na mídia como ultraliberal, disse o seguinte:

"O câmbio não está nervoso, (o câmbio) mudou. Não tem negócio de câmbio a R$ 1,80. Todo mundo indo para a Disneylândia, empregada doméstica indo para Disneylândia, uma festa danada. Pera aí. Vai passear em Foz do Iguaçu, vai passear ali no Nordeste, está cheio de praia bonita. Vai para Cachoeiro do Itapemirim, vai conhecer onde o Roberto Carlos nasceu, vai passear o Brasil, vai conhecer o Brasil. Está cheio de coisa bonita para ver".

Mas como um liberal como Guedes pode dizer isso? Qualquer economista que conheça teoria, ao ler essas frases de Guedes, dirá que Guedes abandonou o liberalismo. 

Pois um liberal não fala contra taxa de câmbio baixa. Taxa de câmbio baixa permite que os cidadãos e as empresas do Brasil tenham acesso a mais bens, a bens de maior qualidade e melhor tecnologia.

Um liberal não fala que uma empregada doméstica não pode viajar à Disney. Pois um liberal é alguém que exalta o individualismo.

Um liberal não define as opções de viagem dos indivíduos.  Pois ele é alguém que exalta a liberdade de escolhas, pensa que uma pessoa deve tentar satisfazer seus desejos.

Bom, como eu disse, economistas sabem avaliar uma política econômica sob o ângulo liberal, keynesiano e comunista.

Mas como pensa um defensor do Distributismo (também conhecido como Distributivismo)? Como se pode avaliar uma politica econômica sob o ângulo Distributivista?

No meu livro, Ética Católica para Economia, eu trato extensivamente sobre o Distributismo, de seus críticos e de suas dificuldades, e, em certo ponto, digo que faltam economistas distributivistas treinados nas faculdades.

Faltam economistas que saibam realmente o que é doutrina econômica distributivista, que leiam os livros de Hilaire Belloc, de GK Chesterton e outros livros de defensores da doutrina (há muitos no momento). E assim aprendam a avaliar uma política econômica sob o ângulo do Distributismo.

Para remediar um pouco isso, eu vou analisar aqui duas sugestões de política que li semana passada sob o ângulo distributivista. 

A primeira foi feita pelo setor privado que lida com futebol e a outra foi sugerida pelo candidato a presidente dos Estados Unidos, Bernie Sanders, e trata sobre produção de maconha.

1) Futebol

Vamos analisar sob o ângulo do Distributismo a questão do mando de campo no futebol brasileiro. É interessante porque o viés liberal e keynesiano/comunista ficam claros também.

A questão é a seguinte: no ano passado, a CBF autorizou que times vendam seus mandos de campo. Isto é, um time que vai jogar com o Flamengo em seu pequeno estádio, pode vender o jogo para um grupo de empresários para que o jogo ocorra em um grande estádio no país. No ano passado, o CSA de Alagoas vendeu seu jogo contra o Flamengo e o jogo ocorreu no estádio Mané Garrincha em Brasília.

Com a venda do mando de campo, o time pode conseguir muito mais dinheiro do que obteria jogando em seu estádio, e assim, supostamente, pode melhorar o time ou contratar jogadores melhores. Além disso, a venda do mando de campo pode ajudar aos estádios elefantes brancos do país a terem partidas, como o estádio de Brasília.

Por outro lado, o time joga fora do estádio que está acostumado e longe da sua torcida e até com torcida contrária, como ocorreu no jogo do CSA, em que 95% da torcida era a favor do Flamengo. Consequentemente, as chances do time perder o jogo aumentam muito.

Este ano de 2020, a CBF proibiu a venda do mando de campo. 

E o Flamengo usou a teoria econômica liberal para ser contra a decisão da CBF.  O presidente do Flamengo disse:

"É claro que eu fui contra a venda do mando de campo no Brasileirão. Eu sou a favor que os clubes possam ter livre-arbítrio e possam fazer o que eles quiserem com o mando deles. Afinal, cada clube é independente para fazer o que quiser. Não foi a proposta vencedora, mas acho que cada clube deve ter o direito de mandar o jogo em qualquer lugar"

Um Keynesiano/comunista pensaria em alguma solução estatal para o caso.

O que pensaria um Distributivista?

Para começar, um distributivista não tem medo de manter negócios em tamanho reduzido, tem até ojeriza a domínio do gigante sobre os pequenos negócios. Neste sentido, deploraria o modo que o futebol é feito hoje em dia em que o poder do dinheiro domina o esporte. Um time passa de uma representação local cultural para um time global em um piscar de olhos com a venda da marca para um empresário, que muitas vezes nem nativo é, como ocorreu na Inglaterra com a venda dos times do Chelsea ou Manchester City, ou como ocorre regularmente também nos times da China e Arábia Saudita. 

Além disso, o Distributismo sugeriria  venda ou a explosão dos estádios elefantes brancos que foram feitos em cidades em que não time de futebol e a construção de um parque  para crianças ou hospital ou coisa que o valha. O Distributismo tem ojeriza à intromissão estatal onde não cabe.

Outra coisa, o distributivista nunca diz que alguém é "livre para fazer o que quiser". Para o Distributismo, a liberdade é uma ideia que tem que vir junto com a verdade, caso contrário vira escravidão.

Sobre o mando de campo, o Distributismo apoiaria a decisão da CBF, mas exigira outras mudanças para que os times que formassem seus jogadores não os perdessem de forma tão rápida para os grandes times. 

Mas acho que os jogadores não apoiariam o Distributismo, afinal, eles querem mesmo é sair logo do time pequeno e ganharem dinheiro em qualquer lugar que pague. O que já mostra a dificuldade de implementação da doutrina.

2) Maconha

Durante um debate do partido democrata na terça-feira passada, o candidato Bernie Sanders (autoproclamado democrata socialista) prometeu se eleito presidente não apenas acabar com a proibição federal da maconha e eliminar registros criminais, mas também ajudar pessoas de cor a encontrar uma posição econômica na indústria. Ele disse:


"Vamos ajudar as comunidades afro-americanas, latinas e nativas americanas a iniciar negócios que vendem maconha legal, em vez de permitir que algumas empresas controlem o mercado legalizado de maconha".

Vamos desconsiderar a questão racial do argumento de Sanders, vamos abordar apenas a lógica de destruir as grandes corporações para formar pequenos negócios para vender maconha.

Será que o Distributismo apoiaria isso?

A resposta é não, porque, primeiro, como eu disse acima, o Distributismo tem ojerija da intervenção estatal, nem que seja para distribuir negócios. 

No meu livro, Ética Católica para Economiaeu apresento todos os livros formadores do Distributismo, em alguns, especialmente os de Chesterton pode-se ver que ele tem dificuldades em sugerir como implementar o Distributismo na prática, uma vez que teria que manter os negócios distribuídos em um número máximo de pessoas, sem prejudicar a liberdade de negócios ao ponto de destruir a formação do capital. 

Mas ele nunca sugere uma intervenção estatal do tipo socialista, pois em todos os livros da doutrina se mostra desprezo pelas decisões estatizantes socialistas, inclusive, eles chegam a igualar o socialismo com a concentração monopolista do capitalismo. 

O Distributismo defende a doutrina do subsidiarismo, em que os problemas devem ser vistos primeiro pelo ângulo da comunidade e a comunidade deve avaliar se consegue resolver esses problemas. Muitos poucos problemas devem exigir solução estatal. Chesterton fala mal do Estado até no seu livro sobre sua conversão ao catolicismo.

Além disso, os autores fundadores do Distributismo teriam ojeriza do uso da maconha e também da libertinagem que a cultura da maconha propaga.

Neste sentido, creio que a solução distributivista seria o banimento da maconha produzida por qualquer um, seja pequeno ou grande negócio.

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É isso.

O Distributismo, como qualquer doutrina teórica humana, tem problemas e dificuldades, eu falo dessas dificuldades, algumas muitas difíceis de serem superadas, no meu livro de ética católica.

Mas acho que o ponto de vista distributivista para a economia é o melhor disponível para as questões econômicas. Por isso, eu propago com orgulho seus preceitos.